Inês olhou para o despertador e viu que já eram horas de se levantar. Apesar de ser bastante mais cedo do que a hora em que habitualmente acordava, tinha mesmo de sair da cama. Iria começar hoje o seu novo emprego.
Já há algum tempo que estava a procura de emprego, mesmo antes de ter terminado o seu curso de Psicologia, e tinha-se apercebido de que o mercado de trabalho nessa área estava em baixa, principalmente para os recém-licenciados.
E tendo terminado o último exame há cerca de um mês, tinha de arranjar algum emprego para ir suportando a renda e os gastos enquanto não arranjasse um emprego na sua área. E isso poderia demorar algum tempo, pelo que há uns meses atrás tinha recorrido a uma empresa de trabalho temporário... Após ter efectuado uma série de entrevistas e os testes psicotécnicos, ficou a aguardar novidades sobre um eventual emprego que essa empresa acharia que seria mais adequado para ela.
Mas estas últimas semanas tinham sido complicadas, devido ao que tinha acontecido com Pedro. Já não falava com ele há duas semanas pois eles tinham combinado dar algum tempo ao outro. Quando ela recebeu a chamada da empresa de trabalho temporário a indicar que tinha sido esolhida para trabalhar como assistente administrativa na área financeira de uma multinacional e perguntar-lhe se ela estava interessada, ela aceitou logo a proposta, uma vez que precisava de algo para esquecer o que se tinha passado nos últimos tempo e seguir em frente com a sua vida. Ainda não tinha exactamente a noção do que é uma assistente administrativa fazia, pelo que era com alguma curiosidade e nervosismo que se preparava para o primeiro dia de trabalho. A primeira grande dificuldade prendia-se com o que vestir...
A primeira impressão é uma coisa muito importante, pois apenas se tem hipótese de causar uma primeira impressão uma vez. E ela queria causar um boa impressão aos seus novos colegas de emprego, ainda para mais porque sentia que tinha de provar algo, pois era apenas uma temporária. Ela não sabia se quereria apresentar-se de forma muito profissional usando um fato. Ou tinha a alternativa de se vestir de forma casual, de calças de ganga e uma blusa discreta... Ou tinha ainda a hipótese de se vestir de forma sensual com a menor mini-saia que tinha e com um top muito revelador... Eram muitas as hipóteses e Inês não tinha ideia de qual seria a alternativa mais apropriada. Após vestir-se e despir-se várias vezes em frente ao espelho, decidiu-se a usar um dos seus vestidos favoritos que apesar de mostrar a sua beleza natural não era muito revelador do seu corpo. Pelo menos não iria ser alvo de comentários menos apropriados pelos seus colegas.
Um pouco antes das nove da manhã, chegou ao seu novo local de trabalho. Assim que chegou à recepção, foi encaminhada para a responsável dos Recursos Humanos com quem esteve a tratar de toda a papelada inicial. De seguida, fizeram-lhe uma visita guiada do escritório, que ainda era maior do que pensava, pois ocupava vários andares e tinha vários open spaces enormes cheio de secretárias com pessoas, todas à frente de um computador... Ela também se apercebeu de que grande parte das pessoas que lá trabalhavam eram mais ou menos da sua idade, pelo que ficou mais aliviada pelo facto de poder conseguir encontrar alguém com que se pudesse dar bem e que a ajudasse a integrar-se na empresa.
No final da visita guiada, a sua colega de recursos humanos apresentou-a ao seu chefe, o Dr. Rui. Era uma pessoa relativamente nova, entre os 35 e os 40, mas a sua primeira impressão não foi a melhor. Ele pareceu-lhe demasiado ríspido quando foram apresentados e não perdeu mais do que cinco segundos com ela. Sim, ela era apenas uma simples temporária, mas mesmo assim, achava que pelo menos o chefe quereria conhecer melhor quem trabalhava para ele.. E durante a manhã, percebeu que o seu novo chefe não tinha problemas em gritar com os seus subordinados se eles não tivessem feito algo como ele queria...
Nesta fase inicial, iria ser treinada por uma colega já com alguma experiência e que já estava na empresa há 3 anos, a Sónia. Pareceu-lhe uma pessoa mais acessível do que o seu chefe, até porque não só era apenas ligeiramente mais velha do que ela (pareceu-lhe que ela tinha cerca de 25 anos), mas porque era uma pessoa muito calma e com muita paciência para ensinar sempre as pessoas acabadas de entrar e que não percebiam de nada do que iam fazer... A Sónia explicou-lhe que o trabalho dela iria consistir em ajudar o departamento financeiro da empresa onde fosse necessário, consoante os picos de trabalho ou fosse necessário substituir alguém que estivesse de baixa ou de férias...
Inicialmente, ela iria estar alocada à area de compras, e iria essencialmente estar a lançar facturas de fornecedores no computador. Sónia passou grande parte da manhã a explicar-lhe o que tinha de fazer, a mostrar-lhe o sistema informático com que a empresa trabalhava e ainda esteve a ajudá-la a lançar as suas primeiras facturas, para se certificar de que ela tinha aprendido correctamente. Não era uma coisa assim tão complicada, pois felizmente, Inês tinha alguma experiência em trabalhar com computadores devido aos trabalhos da faculdade e por isso o Word e o Excel não eram palavras estranhas. Teve alguma dificuldade inicial nesse primeiro dia a tentar compreender o sistema informático onde tinha de lançar as facturas e que campos preencher, e por isso de vez em quando pedia a ajuda de Sónia, que tinha-a posto à vontade para a questionar sempre que ela achasse necessário. Mas esperava que passado uns dias, se sentisse mais à vontade e mais confiante no que estava a fazer...
Felizmente, também o seu horário de trabalho, pelo menos enquanto estivesse no departamento de compras, não era muito extendido e por volta das 18h30 foi mandada para casa. Mas foi-lhe dito para não se habituar muito a esse horário, pois existiam outros departamentos onde poderia ser alocada, onde poderia sair muito mais tarde do que isso durante vários dias.
Inês ficou satisfeita por começar num sitio mais calmo, para poder adaptar-se com calma à empresa e ao trabalho, e esperava que pudesse continuar nas compras por mais algum tempo. E pelo menos sabia que podia contar com uma pessoa para ajudá-la lá dentro, pois a Sónia era de facto uma rapariga impecável. Até a tinha convidado para almoçar, pois imaginava que ela não tinha tido oportunidade de conhecer outros colegas nesse primeiro dia. E foi o que tinha acontecido, pois tinha estado em formação o dia inteiro e teve poucas oportunidades de falar com as colegas que estavam perto nela, numa mesa minúscula num open space enorme. E tinha também reparado que o ambiente de trabalho era um pouco formal, com poucas interrupções para além do café e das idas à casa de banho, muito provavelmente por causa do chefe, que não perdia qualquer hipótese de dar na cabeça de algum dos seus subordinados. E por isso, todos procuravam estar concentrados no trabalho, para evitarem cometerem erros. E uma coisa que a Sónia lhe tinha dito, é que o Dr. Rui às vezes poderia ser um pouco duro, mas que nunca tinha repreendido ninguém que não o merecesse, embora ela não concordasse com a forma como ele às vezes humilhava os colegas à frente de toda a gente.
No final do dia, chegou a casa e ligou à Rita para contar-lhe o seu primeiro dia de trabalho. Após ter desligado o telemóvel, Inês apercebeu-se que tinha sido a primeira vez que o principal motivo dos seus desabafos não tinha sido Pedro... Era um sinal de que o tempo tinha-a ajudado a esquecer o que se tinha passado.... O passado é o passado e abria-se uma nova página na sua vida... Novo emprego, novas amigas e quem sabe... uma nova paixão?
Mas o dia tinha-lhe corrido bem... A incerteza que tinha sobre o seu futuro quando acordou de manhã tinha-se atenuado... Ela estava um pouco insegura sobre o facto deste ser o primeiro emprego a sério dela e nem imaginava o seu futuro se as coisas tivessem corrido mal... Mas felizmente, os seus piores receios não se concretizaram...
O dia seguinte ainda correu melhor... Não só ela já estava um pouco mais habituada ao seu trabalho, como na hora do café foram-lhe apresentadas algumas colegas que também eram temporárias e também estavam lá há pouco tempo e com que se entendeu bastante bem. Tinham várias coisas em comum, como o facto de também ser este o primeiro emprego delas e também o facto de terem também tirado cursos noutras áreas, mas que estavam todas agora como assistentes na área financeira por não terem encontrado o emprego que mais gostariam... e acima de tudo, eram pessoas que estavam dispostas a apoiar-se umas às outras... E ainda por cima, Inês era daquelas pessoas muito aberta, que conquistava qualquer pessoa com a sua personalidade e a forma aberta como dizia o que pensava, o que facilitou a integração naquele grupo... A única pessoa que ainda não lhe ligava muito era o seu chefe, o que a fazia feliz, pois se ele não soubesse quem ela era, menos hipóteses existiriam de ele embirrar com ela.
Os primeiros dias de Inês correram bem, e cada vez menos sentia a necessidade de pedir ajuda à Sónia, pois estava mais à vontade no que fazia... E acima de tudo, estava a gostar do que fazia, embora não fosse o tipo de coisas que queria fazer para o resto da sua vida e já imaginava que daqui a uns meses já estaria farta de fazer a mesma coisa todos os dias. O que lhe valia era o facto de daqui a uns tempo, poderia ser precisa noutro departamento e iria fazer outra coisa completamente diferente...
Mas acima de tudo, tinha feito novos amigos lá dentro e estava a seguir com a sua vida. Aliás, tirando o seu chefe, apenas existia um outro colega, o Diogo, que também era um temporário e que praticamente a ignorava, que não mostravam qualquer interesse em ser seus amigos. De resto, praticamente toda a gente no seu departamento gostava dela e estavam a ajudá-la a integrar-se.... E sentia que a sua vida profissional estava a correr bem... Mas não tinha niguém com quem partilhar essa sensação... E de repente começou a pensar que aquela noite seria a noite ideal para ligar a Pedro, com que já não trocava uma palavra há quase três semanas...
Sem comentários:
Enviar um comentário